Monday, June 10, 2013

Denti-são (da série Tudo Conto)

O garoto foi direto ao ponto, cravando os dentes no dentista.
- Doutor, por quê o senhor cobra tanto?
- Como assim?
- Mamãe falou que estamos gastando uma fortuna em dentista.
- Bom, certamente não fica barato, mas ela também falou noutro sentido, possivelmente. Por exemplo, você pensou que são várias pessoas da sua família fazendo tratamento? Seu pai, pro exemplo, quer reconstituição total.
- É, mas o que o senhor faz?
- Como, o que faço? Faço tudo.
- Tudo, não, o senhor só coloca os nanobots para trabalhar: os nano-robôs é que fazem tudo, reconstituindo os dentes na terceira, na quarta, na quinta dentição.
- Droga de Internet 12.0, só fornece informações pela metade. Escuta aqui, guri, quem é que programa os nanobots? Quem administra a anestesia para vocês dormirem e já acordarem com tudo pronto? Quem compra os nanobots, que custam uma nota preta?
- É o senhor, tá certo, mas os programas estão disponíveis na i12.
- Então tente fazer você! É preciso calcular os ângulos, a altura e conformação tridimensional geral do dente, a coabitação conjunta deles, a inserção nas mandíbulas, a chance de rejeição, a largura de cada um, a geometria de encontro de um com outro, a dureza, o encapamento (que é feito sob encomenda: você sabia que os artistas pagam uma fortuna para ter encapamento de ouro, de platina, de pó de diamantes? Os de vocês não custam nem um centésimo, tá bom?).
- Tá certo, doutor, mas mesmo assim é muito.
- Então vá enfrentar os seis anos da faculdade, com as aulas de física, engenharia, química, desenho por CAD-CAM 87 em 3D, cerâmica e tudo mais e você vai ver que está até barato. Aliás, quando eu era pequeno meu pai contava uma história, de quando tinha posto de gasolina e um garoto como você chegou bravo e depois de ter recebido os dois litros de gasolina no recipiente, disse assim:
- "Papai falou que o senhor é ladrão."
- "Por quê, ladrão?"
- "É que o senhor tira gasolina debaixo da terra e vende pra gente."
- "Ah, é, então devolve aqui e fala pro seu pai tirar gasolina de debaixo da terra."
Pegou os dois litros e derramou de volta no tanque. - Você tá igualzinho àquele garoto, vá estudar, ô menino. E aplicou mais anestesia do que o normal, só de raiva. Um tiquinho a mais, para calar o inconveniente. Precisava falar com o pai e a mãe desse abelhudo e insolente.

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