Padre
Zezinho lançou a candidatura dele. De início o pessoal riu: "Padre
Zezinho tá ficando doido, zureta de tudo". À boca pequena, claro, porque ninguém
teria tanta audácia de falar diretamente, até porque padre Zezinho era
respeitadíssimo na comunidade. Padre Zezinho não arredava pé: queria porque
queria se candidatar. " Por
que não?", perguntava, fazendo cara de
inocente.
O bispo o chamou
lá.
"Ô, José, que
estória é essa? Eu te conheço há trinta e tantos anos e agora você vem com
essa? Que é que deu em você?"
Padre Zezinho
explicou. E a democracia?
O bispo achou que
com o tempo padre Zezinho entraria nos eixos e desistiria da idéia, e deixou
por isso mesmo. Enganou-se, porque padre Zezinho estava cada vez mais firme. De
brincadeira em brincadeira a idéia foi crescendo, a paróquia dele aderiu, a
princípio meio ressabiada, mas depois com cada vez mais audácia e o movimento
foi passando de paróquia a paróquia, até que a cidade (não diremos o nome, mas
todo mundo sabe qual é) quase toda aderiu. "Zezinho,
Zezinho, Zezinho".
Ave, credo, que gente!
O bispo veio
visitar.
Padre Zezinho
explicou de novo. E a democracia?
" Que
democracia? Endoidou? Na Igreja não tem isso de democracia, não. Não é sistema
presidencial nem republicano. O Papa é o Vigário de Cristo, o vice-rei do Trono
de Cristo, o vizir, o primeiro-ministro do Rei dos Reis. Na ausência de Cristo,
para todos os efeitos ele é rei, não tem isso de democracia, não senhor, a
história é outra."
Padre Zezinho já
tinha passado dos 60 e fincava pé.
" Mas
não teve padre que foi eleito?"
"É, teve, mas
foi uma vez ou outra, muito raramente, e a forma foi diferente, você não
aprendeu nada em Roma?"
"Sim, eu sei,
mas acho que já está na hora de mudar."
E continuou
firme.
O bispo ameaçou
excomungar os que o acompanhavam nessa idéia maluca e o movimento foi
esvaziando. Os aderentes festivos foram se afastando do padre Zezinho, que
agora estava cada vez mais sozinho, rezando missas para poucos. Os políticos
que tinham ido prestar solidariedade no momento em que a imprensa do mundo
inteiro tinha se interessado também foram embora. Padre Zezinho agora estava na
oposição, e na oposição com ele estavam poucos e esses poucos foram ficando
cada vez em menor número, número que foi diminuindo até se poder contar nos
dedos de uma só mão.
Padre Zezinho não
desistia.
Ô, que cara mais
teimoso, gente!
Padre Zezinho não
desistia.
O cardeal do Rio
de Janeiro virou uma arara. A imprensa continuava a tocar fogo, principalmente
a ligada aos evangélicos, que desejavam destruir a Igreja Católica. O pessoal
do deixa-disso aproveitou para sensibilizar padre Zezinho.
Isso padre
Zezinho não queria, porque era totalmente fiel à Santa Madre Igreja, que amava
de coração desde a infância.
O bispo voltou
com um ultimato.
"Ou
você para ou será destituído de suas funções. É isso que você quer?"
Não era isso que
padre Zezinho queria.
Padre Zezinho
queria que sua candidatura a Papa fosse levada a sério e que houvesse uma
votação universal dos 1,3 bilhão de católicos, vê se pode! Finalmente padre
Zezinho desistiu, não sem antes causar grande mal, porque por toda parte as
pessoas começaram a se perguntar se num mundo democrático não seria mesmo
conveniente eleger o Papa por votação direta. Complicado, caro, mas útil, afirmaram
os teóricos da sedição, da sublevação, da revolta. Os que se interessavam pelo
rompimento do poder cristão jogaram gasolina na fogueira e por toda parte
lavrou incêndio de grandes proporções.
Padre Zezinho
acreditava na democracia.
Ah, se a
democracia fosse aquilo que padre Zezinho acreditava! Mas não era, nem de
longe.
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