A tribo inteira
estava em volta de mim, homens, mulheres e crianças, até as velhas e os velhos,
todos mesmo esperando ansiosamente. Não sabia por onde começar, comecei de
qualquer jeito.
- Como vocês sabem
(olhei para os que estavam comigo na caçada) o vórtice me pegou e me deixou não
sei onde, um lugar estranho, longe de nossas áreas de caça, nunca tinha visto.
Vieram uns de pele negra (mas tanto tinham rosto negro quanto branco) e me
levaram, me chamaram de “mendigo”, não sei como entendia aquela língua, me
levaram e despudoradamente tiraram minhas peles, rasparam minha cabeça com as
mãos que agora já tinham dentes mais duros que o sílex mais duro.
Uns sorriram
aqueles risinhos de mofa idiotas, duvidando, fiquei furioso.
- Foi sim, mão de
aço, que depois eles largaram de banda, olhei para o chão e todo meu cabelo
estava lá, montes imensos, disseram que era para tirar os piolhos. Fiquei como
que nu, sem cabelo nenhum. Depois me levaram mais para dentro da caverna até um
buraco e depois de passar algo fedorento em mim, me colocaram debaixo de algo
num cubículo, mexeram na parede e começou a cair água quente, quase tive um
troço! Dacor, você vai me deixar contar ou quer sair no tapa? Fiquei ali,
estava até gostando daquela água quente. Procurei olhar onde estava a
cachoeira, mas não havia, a água vinha de cima, do nada! Depois mexeram na
parede de novo e parou, eu estava ficando cada vez mais assustado com a magia
dos deuses. Levaram-me a outro lugar, me vestiram essas roupas que vocês estão
vendo, não são peles, mas esquentam, são fininhas, mas esquentam.
Alguém pediu as
roupas “só pra ver”.
- É ruim, hem? Você
vai fugir com elas. Aí me colocaram dentro de uma caixa junto com outras
pessoas, me amarraram e essa caixa se movia, juro que se movia! Não é mentira,
não! Balançava para lá e para cá e se movia, depois parou, fiquei
assustadíssimo, logo eu que sou guerreiro, quase me borrei, não tenho vergonha
de dizer.
As crianças riram.
- Aí entramos
noutra caverna, muito alta, era uma montanha cheia de faces brilhantes que iam
até bem lá em cima. Tinha umas caixas no fundo que ficavam abrindo e fechado,
as pessoas entravam nelas e quando abriam não tinha mais ninguém! Eu juro! Ela
engolia as pessoas. Fiquei em pânico, não queria ir de jeito nenhum, me
arrastaram na marra e me colocaram lá, a porta fechou, ficamos ali parados um
momento sem fazer nada, depois a porta abriu e já estávamos noutro lugar,
aquele de antes tinha sumido.
As pessoas estavam
de olhos arregalados, umas se benziam.
- Entramos em outra
caverna, fomos para a parte do fundo, um deles mexeu na parede e do nada surgiu
água, assim, puf, do nada, pra que eu iria mentir? Esse mago me deu uma vasilha
de uma cerâmica que não tinha parede, não sei explicar, só que água não derramava,
a gente ficava olhando em volta e não derramava, era estranho demais, como
gelo, só que a água estava na temperatura mesmo. Bebi, era água mesmo. Bebi
mais, água mágica saída da parede. Milagre. Como aquele mágico fizera essa
feitiçaria?
As pessoas em volta
estavam se afastando, se persignando, estarrecidas, cuspindo e pedindo as
bênçãos dos deuses, pegando seus amuletos, torcendo os dedos.
- Depois, outro
mago foi até uma caixa, mexeu nela e o fogo pulou! Não acreditei, coloquei o
dedo, queimou, é este aqui (vários vieram ver). Queimou, doeu demais, como fogo
mesmo. Botou uma vasilha e depois de um tiquinho de tempo tava quente, me deu umas hastes pontudas para pegar a comida, comi,
estava quente. Então ele pegou algo de uma caixa grande, estava gelado, saindo
fumaça, colocou numa caixa pequena, tirou, estava quente: mais magia! Comi,
queimou minha língua, não acreditei.
As crianças já
estão quase dormindo, amanhã a gente continua.
Ih, sobre esse Céu
dos deuses tenho muito a contar, fiquei uma lua inteira antes de o vórtice me
trazer de volta.
Serra,
segunda-feira, 02 de abril de 2012.
José Augusto Gava.
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