- Marte, ei Marte.
Marte fez que não
escutou.
- Marte, Marte.
Como ele viu que
não ia conseguir, falou a contragosto.
- Caramba, agora
você nem deixa de um dia para o outro, conversamos agorinha mesmo.
- Meus bichinhos já
chegaram aí?
- Que bichinhos?
- Esses que ficam
furando minha pele.
- Não, mas eu senti
umas coisinhas pousando, só que não eram vivas.
- Pois é, eles
chegaram à Lua, a pele dela já é problemática, agora uns deles chegaram lá,
ainda bem que não infestaram, voltaram.
- Ó, se você mandar
essas coisinhas pra cá vou ficar bravo.
- Não sou eu que
mando, eles vão sozinhos. Começaram a sair da minha pele. Chama Júpiter aí.
- Ele não vai
gostar, chama você. Por que você não fala com Vênus?
- Ela fica coberta
de nuvens, tá na adolescência, sempre enfiada debaixo das cobertas, nem
responde, ela é um mistério. Júpiter, Júpiter.
Júpiter fez que não
escutou.
- Não adianta você
se esconder, sei que você está aí.
JÚPITER (muito
aborrecido) – Bem que Marte diz que você é uma chata, tô começando a concordar.
Terra, eu tenho mais a fazer com esse monte de filhos. Não se esconde não,
Saturno, ela é sua irmã também, pega um pouco do peso.
SATURNO (que estava
tentando se esconder, fica ao mesmo tempo embaraçado, sem graça, e irritado) –
Caramba, você tinha que me mostrar, poxa, que chato.
TERRA (reparando em
Saturno) – Ô, irmãozão, ajuda aí.
SATURNO – do que se
trata?
TERRA – os meus
bichinhos estão saindo na direção de vocês, ouço dizer que vão pousar em
Europa, em Titã, em Ganimedes.
SATURNO E JÚPITER
(juntos) – Ah, não.
TERRA –
infelizmente, é sim, já mandaram as células deles, os pequenos esporos até
Plutão, pobre do infeliz. Mandaram VÁRIOS na direção-sentido de vocês, não
repararam?
SATURNO – Até que
vi mesmo uns fotografando meus anéis, fotografaram você também, né, Júpiter?
JÚPITER –
fotografaram, sim, fotografaram também Netuno, Urano, estão em toda parte,
essas praguinhas. Não sei como poderiam nos prejudicar.
TERRA – A
capacidade de multiplicação deles é incrível, é um vírus terrível, infestação
rápida. Ainda ontem, 15 mil ciclos (Não foi, Marte? Ontem mesmo falei com você,
você até reclamou, lembra? MARTE – sim, sim, sim!), eles eram pouquinhos, hoje
já são bilhões, esburacaram minha pele toda, tô com umas coceiras incríveis.
SATURNO
(desprezando) – problema seu, você que criou.
TERRA – mas é isso
que estou falando! Andei ouvindo que eles vão infestar as filhas e os filhos de
vocês, dos pequenos aos grandes ainda hoje, sei lá, 200 ou 300 ciclos, talvez
menos.
NETUNO – que é isso,
minha gente! Deus nos livre! Tão pouco assim? Aqui eles não vêm!
TERRA – você que
pensa, eles são terríveis. Quem poderia pensar que criaturinhas assim pequenas
iriam inventar os esporos como proteção para viajar no vazio entre nós? Até
enviaram esporos na direção de papai, de Mercúrio, de Vênus, já os desceram em
Marte, ele que não contou pra vocês...
JÚPITER (com raiva)
– caramba, Marte, por quê você esconde essas coisas?
MARTE (enfastiado)
– não escondo, só não falei porque pensei que era coisa pouca, banalidade.
URANO – tudo pra
você é pouco. Eles proliferarem nesse ritmo não diz nada pra você? Raciocina um
pouco, não dói. Pare de pensar nas glórias passadas e pensa no presente, droga!
MARTE – ah, não
enche, não, não estou tentando não ver, apenas não dei bola, pensei que a Terra
iria se tratar, ela não se cuida, não toma remédio, não toma banho de radiação,
fica protegida pelo cobertor atmosférico, não cuida da pele, isso é que dá.
TERRA – ah, Marte,
quando você tinha os seus, você também não se cuidava, eu lembro, uns 15 mil
dias atrás, 225 milhões de ciclos. Pra onde eles foram?
MARTE – eu vou
saber? Cuida da sua vida.
Serra,
quarta-feira, 04 de abril de 2012.
José Augusto Gava.
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