Thursday, August 15, 2013

Futemática (da série Se Precisar Conto Outra Vez)


O Professor chegou com umas doideiras que vou te contar!
O plantel todo ali prestando atenção, mas uns riam, sim, que a gente via, nem adianta negar. Até eu ri das loucuras dele.
Ele misturou matemática com futebol, porisso algum espertinho chamou de Futemática, matemática do futebol.
Começou dizendo que direção (”por exemplo, esta reta”, disse ele) forma ângulo <; daí, treinamos ângulos dias inteiros até sabermos distinguir 10º, 45º, 90º, o que fosse e acertar precisamente. Até que ele tinha um pouco de razão.
Depois passou aos sentidos, para frente e para trás, adiantar ou atrasar a bola, que sempre seguia parábolas. Que era parábola? Aprendemos tudo de parábola e de gravidade, aquelas fórmulas de enlouquecer a gente, potência de tiro, distância a atingir, encobrimento, bola rente ao solo, máximo alcance aos 45º graus, etc., etc., etc., aquilo não acabava nunca, um mês inteiro, quando é que íamos jogar futebol? A turma tava inquieta, uns pensaram em sair, mas já estavam acostumados a gastar, quem ia querer voltar pra pobreza?
Depois, ele entregou a faixa de capitão ao goleiro que, disse ele, era o que ficava parado e tinha melhor visão de campo e no avanço do adversário podia posicionar a defesa. Quem é que já viu goleiro como capitão? Mas não é que melhorou nos amistosos?
Depois, ele passou a falar do retângulo do campo.
“Que é um retângulo?”
Os companheiros não sabiam onde enfiar a cabeça. Um falou “é uma coisa assim” e traçou um retângulo torto.
O Professor então dividiu os retângulos em ESTÁTICOS e DINÂMICOS e mostrou que estático era o desenho, dinâmico era o movimento e eles se combinavam para formar a       MECÂNICA FUTEBOLÍSTICA. Nunca tinha ouvido falar disso, que doideira. Ele disse que a MF (mecânica futebolística) era uma parte da psicologia e que nós éramos psicólogos jogando com outros psicólogos. Eu, hem, eu não sou doido não, meu camaradinha, quero ficar longe de psicólogo.
Mas ele tanto explicou que compreendemos: devíamos entender várias necessidades dos times adversários, dos cartolas, dos outros professores, das torcidas, quando podíamos perder e quando devíamos ganhar para afastar tal ou qual time, tanto falou que acabamos compreendendo pelo menos uma parte.
E quanto ao campo, ele criou um programa para monitorar os jogadores presentes que podiam ser vistos nas gravações das televisões; trabalhão lá na universidade, a cada jogador atribuíram um número-pixel e criaram MAPAS DE JOGOS que mostravam a densidade em campo, não sei explicar direito. Onde ficava o maior ajuntamento (ele chamava de adensamento, estou lembrando)? Vimos que frequentemente, quando havia ajuntamento de um lado do campo e entrava um sacana sozinho pelo outro, a bola jogada para este fatalmente levava a gol. Chamou isso de “movimento dispersivo”, será isso?
Você não vai acreditar que foi isso que nos deu os oito títulos seguidos, depois que ele saiu perdemos três e ganhamos de vez em quando. Ganhei uma fortuna.
Ih, tem muita coisa.
E ele transformou os jogos. Criou um Atlas futebolístico, um globo mundial para todos os times, lá com os alunos dele de estatística na universidade, que é esta onde estamos. Isso foi quando eu tinha 16, ficamos um ano nisso, com 17 entrei pro profissional, ganhamos aquelas oito, ele saiu, fique mais 13, saí com 38 e me matriculei no curso de matemática em homenagem a ele, que é o professor aqui que está se aposentando hoje, obrigado Professor pelos melhores anos de minha vida.


Serra, segunda-feira, 02 de abril de 2012.
José Augusto Gava.

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