Te Conheço de Algum Lugar II
Desci as escadas na casa da mina filha e genro e chegando na sala deparei com o cara me olhando. Bem apanhando, isso era, de certa idade, mais pra magro, cabelos brancos, o rosto um pouco chupado. Magro, pode-se dizer. Branco, assim como eu. Seria ladrão?
Olhei fixamente, ele também me olhou.
E se ele avançar pra mim, já estou um pouco velho, será que vou ter forças pra me defender? E se ele quiser me bater?
Fiquei quietinho, talvez ele fosse embora.
Não foi, ficou ali parado, quieto também.
Talvez não fosse do mal, não tinha cara.
Meu Deus, quem deixou a porta destrancada? Ou foi minha filha ou meu genro ou uma das crianças, que imprudência, ai Jesus, com os perigos dos dias de hoje. Talvez tenha sido a Genilda. Ela já está um pouco velha, talvez esteja caducando.
- Quem é o senhor?
Ele não disse nada.
Do meu lado estava escuro na sala no térreo, desci para beber água, sou diabético. Do lado dele havia uma luz por trás, parecia que dava pra casa dos vizinhos, não sei, era algo que eu conhecia.
Ele não disse nada, que mal-educado! Talvez eu estivesse surdo, porque pelo menos parecia que falava.
- O que o senhor quer?
Nada, nada, nada mesmo.
Tremi um pouco. Tem gente lá em cima, mas não vou fazer escândalo, não sou disso, tenho criação.
- Vou ligar para a polícia (e fiz que saía, acho que ele se assustou porque ia saindo também, eu voltei, ele igualmente voltou).
E se eu gritar, será que minha filha vai ficar aborrecida comigo? Amanhã eles tem de trabalhar, não quero ser fardo para ninguém.
Fui recuando, ele recuou também, talvez tivesse tanto medo quanto eu, vai ver que estava se borrando também, pobre coitado, acho que vou estender a mão, a amizade é o melhor caminho, desarmar o espírito, vai ver também está velho e cansado, querendo conversar na solidão dele, sei lá.
Fui andando até dar uma cabeçada no espelho, com o barulho minha filha desceu aborrecida.
- Papai, já falei para você não descer sozinho, nem muito menos abrir a porta da rua e sair de casa. O senhor saiu?
Eu disse que não.
- Droga, deixaram o espelho sem o pano protetor de novo, só pode ser o René, quando a mãe dele fica aqui eu trato com toda deferência. Renéeeee! Precisamos conversar. Você tirou o pano do espelho?
- Como você pode me acusar? Podem ter sido as crianças, elas gostam de zoar seu pai.
- Vou falar com elas amanhã mesmo.
- Amanhã é sexta, dia de aula, o rendimento vai diminuir, fala sábado, se for dar castigo pesa mais.
Os pais e as mães sabem ser cruéis.
ALZHEIMER
Serra, terça-feira, 13 de novembro de 2012.
José Augusto Gava.
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