Saturday, July 16, 2016


Gronk XI: Ao Mirante

 

Como ficou dito, o Mirante tinha aquilo de revirar os olhinhos, era um precursor, vivia drogado, até mais que os de agora, e tinha “visões”, ele se convencia de que aquilo que pensava ia acontecer e como seria décadas, séculos e até milênios depois, ninguém poderia conferir, não era ciência, não tinha poder preditivo. Se bem que, algumas vezes, assim num tempo mais curtinho ele acertava mesmo, era até esquisito, dava tremedeira na gente ficar olhando aquele pulha acertar uma e outra.

Claro, depois que o Mirante salvou a pele do Gronk VÁRIAS vezes (Quem é que está contando? Exceto para cobrar um ou outro favor, quem é que conta essas coisas?), eles ficaram amiguinhos, talvez também por serem alvos das brincadeiras inocentes um pouco pesadas dos demais, até os novatos queriam entrar nessa, levaram socos no pau do nariz, alguns quebraram, até foi bom, porque podiam mostrar para as mulheres, alegando confrontos duríssimos com as terríveis feras (não deixavam de ser, sabe como é, seres humanos).

Para agradecer ao amigo os vários avisos recebidos – inclusive aquela vez em que ele disse “não vai por aí, não, tem uns esperando com porretes” – Gronk desejou fazer uma comemoração, o Guerreiro do Mês (ao que Mirante disse: “no futuro vão se aproveitar dos trabalhadores com isso”, mas foi coisa a que ninguém prestou atenção, inclusive o Gronk, foi tipo assim um devaneio; as pessoas de bem não falavam “tipo assim”, porém em cima o Mirante adiantou – “um dia vão falar”).

TANEU (contrapondo imediatamente) – não, Gronk, nem pensar.

TURIM (filho do precedente, mais idiota ainda, se possível) – de jeito nenhum.

TANEU – cale a boca, você é novato, vá limpar as privadas.

TUOR (só pra provocar Taneu) – não implica com ele, pode falar, Gronk, eu garanto seu irmão. Como é isso?

GRONK (se sentindo valorizado) – então. A gente elege um, agora é o Mirante, o primeirão, o inicial, o original, depois serão outros, um por mês, a gente tira uma fotografia.

BAN (vendo o aglomerado e se aproximando) – que é fotografia?

MIRANTE (fixando o Gronk duramente) – nada, não, é uma coisa que vai existir.

BAN (muito acertadamente, de vez em quando ele acertava) – se não existe, como vamos utilizar?

GRONK – ah, é. Ou então a gente em roda olha fixamente para ele, pronto, durante o próximo mês ele vai ser o maioral, todo mundo vai olhar para ele com ódio, puxa-saco de patrão.

REAGAN – abaixo o estado.

THATCHER – o que é isso de sociedade?

BAN (olhando ao redor desconfiado) – ó, os que já morreram não falam não, é a regra, só fala através de médium. Gronk, explica isso.

Não era mais como antigamente, que o Gronk era completamente desprezado. Depois que as ideias dele funcionaram e as patentes foram registradas, tinham começado a dar algum valor a ele, as aldeias vizinhas vinham pagando para usar as coisas que ele tinha inventado, virou uma espécie de heroizinho, principalmente para as mulheres, que podiam usar para trocar por bijuterias, joias, ouro, diamantes, de preferência diamantes, diamantes são para sempre, Lucy in the sky with diamonds.

GRONK (explicando) – então (ele gostava muito de falar assim, “caralho, então o quê? ”, como se fosse dar uma explicação valiosíssima; ficou satisfeitíssimo com todo mundo prestando atenção nele). Escolhemos um, aquele é o herói do mês, ele trabalha em dobro, as pessoas que o odeiam podem odiar justificadamente, ele fica feliz, para de reclamar aumento, para de chegar tarde, carrega tudo com satisfação...

O pessoal pegou o espírito da coisa, principalmente a parte que dizia respeito a descarregar no fulano um monte de tarefas.

BAN (pensando nos 63 sobre suas ordens, se fosse dar a volta demoraria a chegar nele, que poderia se colocar no final da fila; cauteloso:) – chefe também tem de fazer?

GRONK (percebendo a coisa) – não, chefe não, porque chefe já está em evidência mesmo, todos olham para ele todo mês, bajulam, etc.

BAN (pegando a deixa de que não teria de ser esforçar em dobro) – acho bom, parece legal, vamos adotar, primeiro o Mirante. Ao Mirante, gente! (e levantou a lança com pedra na ponta, invenção do Gronk).

Levantaram o Mirante, com isso de ficar festejando em vez de caçar a manada de gnus se mandou, foi embora, eles só caçaram coelhos e bichos pequenos, as mulheres ficaram brabas, menos com o Mirante, que ajudava nas pesquisas dos trabalhos sondando o que os professores estavam esperando e, é claro, o Gronk, sempre cheio de novidades e agrados. Elas adotaram a medida na caverna, de onde se espalhou nas vizinhanças, chegando à McCaverna.

Serra, terça-feira, 19 de janeiro de 2016.

GAVA.

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