Tutto
Buona Gente, Cosa Nostra
Tudo gente boa, coisa nossa.
Familiares, é isso.
O sangue fala mais alto.
Coisas assim.
A jornalista foi entrevistar o chefão da
Máfia na saída do tribunal.
JORNALISTA (quase colocando o microfone no
nariz dele, insolente, impositiva) – o que o senhor diz desse julgamento?
CHEFÃO (tirando um caderninho e anotando com
lápis de marceneiro, daqueles grossos: “insolente, impositiva”) – deu o que
tinha que dar.
JORNALISTA – e o que tinha que dar?
CHEFÃO – o que deu.
JORNALISTA (irritada) – estamos dando voltas.
CHEFÃO (anotando: “metida a besta, candidata
a envelope”) – qual o seu nome, minha filha?
JORNALISTA (esperta, dando o nome de uma
prima) – Sueli.
CHEFÃO (olhando o crachá) – não é isso que
está no crachá (anotando: “mentirosa, quer escapar, vou colocar Sueli no
envelope”). De que família?
JORNALISTA (dando o sobrenome de um colega) –
Honório.
CHEFÃO (olhando de novo) – não é isso que
está no crachá (anotando: “colocar o nome inteiro dela, senão, não vão saber
quem é quando acharem”).
JORNALISTA – vamos voltar ao assunto. O
senhor achou certo seu filho ter saído impune de três assassinatos?
CHEFÃO (meditativo) – bem, as pessoas estão
nervosas, armadas, são provocadas, deu no que deu.
JORNALISTA (indignada) – mas eram três pessoas
comendo na mesa ao lado!
CHEFÃO (anotando: “quer implicar com o
menino”) – bom, mas se elas olharam de cara feia ...
JORNALISTA – como, de cara feia? O vídeo do
restaurante mostrou, estavam de cabeça baixa.
CHEFÃO – então! Estavam rindo, debochando.
JORNALISTA – eu vi o vídeo, não estavam, não,
estavam rindo da piada que contaram.
CHEFÃO – e como meu filho poderia saber?
Contaram para ele?
JORNALISTA (ardilosa, indecorosa) – e como é
que SETE júris faltaram ao dever?
CHEFÃO (anotando: “ardilosa, indecorosa, quer
saber demais”) – sei lá, ué, ninguém tem compromisso hoje em dia! Ficam dando
as desculpas mais esfarrapadas.
JORNALISTA (olhando as anotações) – 12 foram
atropeladas, quatro se jogaram da ponte, seis tiveram sintomas de envenenamento
...
CHEFÃO (dando de ombros) – eu tenho culpa se
as pessoas se jogam na frente dos carros? As pessoas tentam brecar, mas elas se
jogam debaixo dos eixos.
JORNALISTA – e as quatro que se jogaram?
CHEFÃO – três eu estava lá, subiram no
parapeito ...
JORNALISTA (cruel, debochando, balançando os
ombros) – claro, com armas apontadas, os transeuntes contaram.
CHEFÃO (anotando: “cruel, debochada”) –
detalhes.
JORNALISTA – e o senhor pagou uma junta de
advogados.
CHEFÃO – foi, como quando minha filha
arrancou os bagos do namorado namorador dela com os dentes, disseram que foi
crueldade, ele estava amarrado, as pessoas disseram aquilo, porém se tratava de
meros jogos sexuais, brincadeira de crianças, essa coisa de algemas, nem
aprovo, no meu tempo não tinha disso, o máximo que a patroa aguentava eram umas
chicotadas e olhe lá.
JORNALISTA (intrusa) – e sua esposa participa
disso?
CHEFÃO (anotando: “intrusa”) – hum! Ela falou
comigo: “ó, se esse menino ficar preso nunca mais você vai ter aquela comida
que gosta tanto”. Vou ficar sem o resto da vida?
Serra, quinta-feira, 04 de fevereiro de 2016.
GAVA.
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