E Se Ele Morrer?
Eles eram melhores
amigos, só viviam grudados desde a faculdade, entraram na mesma firma,
cresceram juntos, as esposas - ora na casa de um, ora na de outro - faziam
churrascadas, as crianças também eram amigas, não se desgrudavam, iam para a
mesma escola, as esposas combinavam de ir no sábado ao mesmo supermercado, tudo
isso, era até bonito de ver, os demais amigos e os colegas não invejavam porque
até ajudava a endireitar o mundo, com tanta coisa de ruim...
Um dia estavam na
mesa de reunião, o chefe estava atrasado (aliás, como dizem, “chefe não se
atrasa, alguém ou algo o reteve”), ficaram os grupos conversando, eles também.
RAMBO (inclinando-se
para a direita e cochichando) – Walter, e se ele morrer?
WALTER (distraído) –
ele, quem?
RAMBO (mais baixo) –
ele.
WALTER (ainda
desatento) – ele, quem?
RAMBO (frisando) –
ele, quem? Ele, caramba (já tinha se arrependido de falar).
WALTER (prestando
atenção, olhando para a esquerda) – ele, ele?
RAMBO – sim. Pensei e
fiquei em pânico, quase tive um colapso, comecei a tremer.
WALTER (atentando ao
amigo pela primeira vez) – ELE?
RAMBO – sim, fale
baixo, meu coração está acelerado.
WALTER – ELE, ELE?
RAMBO (sussurrando) –
é.
WALTER (afastando um
pouco a cadeira) – ELE? Por que alguém pensaria algo assim?
RAMBO (sem graça) –
sei lá, ando meio deprimido, você sabe, de pensamento em pensamento...
WALTER – pôrra, Rambo
(era por causa dos músculos enormes, parecido com o personagem, um tanque de
guerra), que merda é essa? Logo ELE?
RAMBO (assustadiço) –
não grita, caramba, fala baixo, o pessoal vai ouvir.
ALGUÉM DO LADO
ESQUERDO – que ele?
Pura que o pariu,
logo o fofoqueiro do Manoel Gil.
WALTER – nada, não.
MANOEL GIL – eu ouvi.
Vocês estão falando DELE? Por que alguém pensaria uma bosta dessas?
WALTER (olhando
acusativo o grande amigo que estava minuto a minuto perdendo apoio) – é, por
que?
RAMBO (empurrando a
cadeira do outro) – vai cuidar da sua vida, Gil.
Gil, virando-se para o
lado esquerdo falou com Marilda, que era gerente de vendas. Marilda falou com
Inácia, do RH, que passou para Norberto, que falou com Franco e foi rodando,
chegou de volta ao Walter.
À DIREITA DO WALTER
(era o Nando, ele aumentava as coisas pra caramba, cochichou no ouvido do
Walter) – parece que há uma conspiração no prédio para assassinar (a voz
falhou) ELE.
WALTER – o quê?
NANDO – estão
conspirando para mata-Lo.
WALTER – matar quem?
NANDO – ELE.
WALTER – que isso???
Nando se inclina para
a direita para ouvir a nova notícia. Vira para a esquerda e cochicha de novo.
NANDO – e o assassino
está nesta sala. Não se sabe se é homem ou mulher.
O rapaz do café, que
estava perto, subiu dois lances de escada para falar com a mulher do café de
cima e desceu dois andares para falar com o de baixo.
RAPAZ DO CAFÉ –
parece que há um grupo de terroristas no prédio de emboscada querendo matar
ELE. Vários homens e várias mulheres.
Nisso chega o chefe e
antes que o Walter ou o Rambo tivessem tempo de falar – pois a balbúrdia tinha
se tornado terrível, todos gritavam, amedrontados, duas mulheres desmaiaram, um
cara fror teve um piripaque – alguém se levantou e para mostrar intimidade
buzinou no ouvido do chefe.
ALGUÉM (dando o
serviço rapidinho, em apenas 10 minutos) - ... e foi isso.
CHEFE – gente, como
vocês souberam disso?
VÁRIOS (apontando os
indicativos) – veio do Walter.
CHEFE – você, Walter?
WALTER (afastando a
cadeira em relação ao Rambo) – foi o Rambo.
RAMBO (estarrecido) –
o quê, o quê?
WALTER (indo para a
janela, encostando-se nela) – sim, foi você. Mas chefe, ele só estava pensando.
CHEFE – você estava
pensando em mata-Lo, Rambo?
Nisso os 38 andares
do prédio estavam fervendo, alguém telefonou para a CIA e o FBI, que por sua
vez passaram para Homeland, para a NSA, o DIA, que comunicaram com POTUS, que
colocou o país em estado de alerta, DEFCON 3.
A coisa se espalhou
pela cidade, na Rússia Putin disse “não existe isso de ex-KGB” e colocou as
armas atômicas de prontidão, aproveitando para anexar a Criméia e cercando a Ucrânia.
Apelou para o Conselho de Segurança e virou os silos para a China, primeiro
tratar dos mais próximos. A Coréia do Norte, num rompante, virou os mísseis
para a Coréia do Sul, “se nós formos para a merda não vamos sozinhos”, a China
mirou o Japão e a Índia, que moveu as tropas maciçamente para o Paquistão, que
sem mais demora jogou dois atômicos na Caxemira, a coisa toda foi se
espalhando.
EM MARTE – o quê? A
Terra está ameaçando liquidar com ELE?
Serra, sexta-feira,
15 de janeiro de 2016.
GAVA.
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