Eu
Que Antes Cheirava Muito Mais
Não é pó de droga, é só para atrair
sua atenção com título chistoso, engraçado, referindo-se aqui às tremendas
perdas que com meus 56 anos pude acompanhar.
Em 18 de agosto 1963 chegamos a
Linhares, ES-nordeste, de viagem de mudança de Cachoeiro de Itapemirim, ES-sul.
A BR 101-norte não estava asfaltada além de João Neiva, 70 km de Vitória, pelo
que fomos pela estradinha marginal situada à esquerda da BR apenas aberta na
mata outros 60 km, as matas cobrindo as laterais e estendendo-se
indevassavelmente à esquerda e à direita.
Instalaram-se em Linhares no auge da
exploração madeireira, dizem, 400 serrarias que depois de esgotado o local
foram depredar Rondônia e a Amazônia. Ainda hoje Linhares é pólo moveleiro
notável no Brasil, exportando para toda parte.
Destroçaram tudo.
Nós aplaudíamos, porque achávamos
que era o “desenvolvimento” tão apregoado. Também esgotaram a Suruaca, a
lagoa-mangue que margeava o mar-oceano Atlântico entre as areias e as terras 30
metros mais altas onde a cidade se assentava.
Da Mata Atlântica que cobria o ES
todo no descobrimento restaram árvores em menos de 5 % do território capixaba,
tendo sido 95 % dos 45,6 mil km2 das florestas postas no chão.
Presenciei, por convite de um de meus irmãos, tratores gigantescos carregando
correntes, cujos elos eram mais grossos que nossos braços, derrubarem várias
árvores ao mesmo tempo. Nós batíamos palmas, achávamos que era o poder humano
varrendo toda oposição.
Das gigantescas florestas ficaram,
de relativa grandeza ainda, a Reserva de Sooretama com 240 km2
(24.000 há ou, em termos americanos, 60 mil acres, cada acre valendo 4.000 m2
ou 8 lotes de 500 m2) e a Reserva da CVRD (ela já foi do governo e
foi passada junto com a companhia a preços de banana podre) de 220 km2
(ou 22.000 ha). Tudo isso junto dá 460 km2 ou 1/100 ou 1 % da área
do ES, os outros 4 % estando espalhados no restante do território em pequenas
reservas ou em sítios não-devastados nas montanhas.
Antes da devastação a temperatura de
Linhares nunca excedia 35º C e nunca baixava de 15 º C (segundo meu tio A), 20
graus entre extremos. Ventava muito e era fresco, o ar era mais puro e
certamente havia mais pássaros porque existiam mais flores e frutos.
Agora estamos em 2010, quando me
lembrei de escrever isso: passaram-se apenas 47 anos, pouco mais de uma geração
e meia e tudo foi pro brejo. Os jovens não sabem, não testemunharam, tem de
acreditar, se acreditarem. Os mais velhos estão morrendo, vão deixar apenas
palavras.
Crescimento excessivo da humanidade
(eu mesmo o apregoei, agora há uma inércia), direção incorreta dos governos,
má-fé e má-vontade, de tudo mesmo se juntou para tirar-nos os prazeres antigos.
E os jovenzinhos de agora, daqui a 47 anos talvez estejam mais pobres ainda,
por pura frouxidão moral nossa quanto a parar a destruição.
Vitória,
quinta-feira, 16 de setembro de 2010.
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