Saturday, November 30, 2013

O Cansaço dos Velhos (da série Cometários)


O Cansaço dos Velhos

 

Quando eu era jovem minhas referências de velhice mais próximas eram meu pai (que morreu aos 61 em 1978) e minha mãe (que morreu aos 77 em 2003).

Meu pai eu nunca vi reclamando, mas minha mãe, sim, constantemente, a carga dela provavelmente era bem pesada. Então, nos momentos de pânico ela dizia: “estou cansada” ou “vou embora”. Eu me fazia de companhia dela, já que ninguém se importava mesmo a esse ponto, todos ficavam constrangidos e tratavam de “puxar o carro”, saindo de fininho. Por vezes ela dizia que iria sair caminhando e eu dizia que iria junto, sem falar de quando afirmava ter vontade de se jogar da ponte do Rio Doce em Linhares.

Onde trabalho, certa mulher fala de segunda a sexta, durante todo o horário de trabalho que está “cansada”.

O que quer dizer isso?

Não é cansaço físico, sem dúvida não é, no trabalho pouco exigente que fazemos no Fisco. “Cansaço mental” não é também, porque não vejo nenhuma dessas pessoas submetidas a estresse de pensamento, nenhuma delas muito empenhada em investigações profundas e penosas.

É renúncia, é desejo de renunciar, de abandonar os compromissos.

As pessoas “perdem o pique”, perdem o interesse, suas mentes atolam na realidade, já não possuem satisfação em nada: elas pensam (como essa mulher) que ficarão à toa quando aposentadas, que seria melhor após a aposentadoria, mas não será, porque não é a falta de oportunidade, é falta de SENTIDO DE VIDA, orientação da existência – ter mais tempo só significará mais desorientação, mais falta de sentido, mais minutos acordada sem ter o que fazer. A pessoa pode ler livros, pode assistir filmes, pode ir ao centro de compras (shopping center) e não vai adiantar, uma hora chega a renúncia.

Como aconselhou Cristo: sede como crianças.

De espírito sempre renovado, sempre curiosas.

Na falta disso, chega o “cansaço”, a renúncia à vida, o desassossego quanto a em que empregar o tempo de vigília. Alguns poderiam chamar de “tédio”, mas também não é, não é apenas a repetição, pois repito ano após ano a leitura e nunca me canso, a vida sempre é cheia para mim.

Acho que é o “cansaço”, a renúncia que leva ao alemão, ao Alzheimer, à doença do desmemoriamento.

Infelizmente as escolas não ensinaram interesse.

A título de falar do processo de desperdício americano, certo texto colocou que eles jogam fora todos os anos 3 milhões de livros, enquanto compram dois bilhões em igual período, o que dá relação de 3/2.000 ou 0,15 %, bem pouco, pouquíssimo. É certamente um povo extraordinário: em 30 anos, uma geração, acumulam 60 bilhões de livros, tanto quanto 200 livros para cada um dos 300 milhões de habitantes. É absolutamente fantástico. E, não obstante, lá há grande número de indivíduos sofrendo de Alzheimer. Como entender uma coisa dessas? Sem dúvida nenhuma é uma sociedade que está precocemente se tornando gagá, pelo menos parte dela.
Vitória, sexta-feira, 17 de setembro de 2010.

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