O Jorge Foi para o Espaço
Jorge Luiz Calife é o brasileiro que deu a
Arthur C. Clarke a ideia de continuidade de 2001 (ele prosseguiu com 2010, 2061
e 3001, todos muito bons). É de Niterói no espaço, de 1951 no tempo, 61 anos
entre datas. Escreveu a trilogia Padrões de Contato, em que há muitos
exageros mágicos (sem qualquer conotação científica), mas é diversão muito boa
(não li o terceiro).
Comprei As Sereias do Espaço, Rio
de Janeiro, Record, 2001, 14 contos. Logo no primeiro, ele diz na página 14:
“Mas com esse tipo de base só vamos poder recriar o corpo dela. A mente
exigiria uma varredura de mémorons”. Onde ficariam os “mémorons”? Com a série Perdidos
no Espaço, talvez. Como a irradiação de máxima probabilidade é esférica
- contando que a dispersão se dê com a velocidade da luz -, imagine só
reagrupar todo esse pessoalzinho. A dispersão de mínima probabilidade é
browniana, aleatória, e é pior ainda.
Contudo, é como haver afirmação e
contrafirmação: você não pode provar que não, ele não pode provar que sim. É
nesse sentido que é anticientífico, pois não obedece aos critérios de Popper da
testabilidade, não se pode testar.
Não é nisso que quero me pegar.
Ele diz na página 22: “Hugo, Deus não
existe. Isso foi provado pelo teorema de Sinclair-Hobsbawn há trezentos anos”. Acontece
que a Prova ou o Teorema de Godel (embora não prove a existência de Deus)
afirma a insustentabilidade RACIONAL da matemática, motivo para acreditarmos
que o par polar i Deus-Natureza é necessário-suficiente POR EXCLUSÃO – quer
dizer, se não foi a racionalidade quem inventou a matemática, deve haver um
elemento exterior respondendo pela sustentação de toda a dialógica e da
matemática em TODOS os universos.
Depois, Calife diz, mais abaixo, p. 22: “No
final só havia paz e esquecimento”. Ora, para haver esquecimento deve haver
objeto-programa QUE ESQUECE, quer dizer, qualquer mente, devendo permanecer
para então esquecer: quem sustentaria as mentes após a morte? E paz é o
oposto-complementar de guerra: seria situação de paz “eterna”, quando sabemos
que tudo é ciclo. Estaria sendo negada a racionalidade, pois estar nesta é
justamente candidatar-se a ciclo, vários deles, vários ciclos.
Há no livro muitos lugares comuns
ficcionais e muitos preconceitos sociais atuais travestidos de futuro, não há
tempo para comentar ponto a ponto.
Apesar disso, é plástico o bastante para
render bons episódios, desde que sejam depurados das incongruências gritantes.
Serra, domingo, 04 de março de 2012.
José Augusto Gava.
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