O
Espírito das Catedrais
É risível ler essa
história, ou essa incipiente geo-história segundo a qual a Idade Média foi uma
época de atrasos, quando olhamos os seus produtos variadíssimos, em especial as
catedrais.
Olhando as catedrais não
deparamos só com a solução (mesmo hoje) invejável de inúmeros problemas de
engenharia e arquitetura, em composições belíssimas que atravessaram séculos.
Quantos prédios de nossos dias estarão de pé daqui a 700 anos, mesmo se forem
tratados com carinho? As catedrais são preces erguidas. E denotam a maioridade
dos medievos.
A primeira foi, segundo
a Barsa eletrônica, a catedral de Pisa, que é de 1063, há 939 anos - já vai
completar mil anos. Esse ano marca a independência da Idade Média em relação à
Antiguidade, em relação a Roma e à Grécia. A Queda de Roma tendo se dado em
476, 587 anos antes, pode-se ver que é um tempo deveras curto! Menos de 600
anos depois o Ocidente, sob a condução segura da Igreja, já tinha mudado a face
do mundo, desde o escravagismo até as novas relações humanas.
Então, sucessivamente,
os europeus medievais foram erguendo em toda parte notícias, comunicações de
sua independência. Mudaram inteiramente sua Psicologia (psicanálise/figuras,
psico-síntese/objetivos, economia/produções, sociologia/organizações e
geo-história ou espaçotempo). Adquiriram maioridade plena. Aquela única catedral
de Pisa foi o anúncio inicial de uma crescente satisfação do povelite/nação
europeu. Pela primeira vez os europeus não eram nem romanos, nem gregos, nem
judeus, nem egípcios, nem babilônicos, nem persas – deixaram de ser copiadores
para serem eles mesmos. O cartaz anunciador disso foi a Catedral de Pisa,
seguida de dezenas e dezenas, por toda parte.
Cada cidade queria
dizer: “veja, nós somos maiores que o passado”. E eram mesmo, passaram a ser.
Com as catedrais a
Europa anunciou sua superioridade em relação aos complexos de inferioridade, ou
seja, sua igualdade, sua autonomia, sua fortuna, sua independência, sua
liberdade, sua identidade, seu futuro.
Seu, seu, seu e de mais
ninguém.
Não foi na Queda de
Constantinopla em 1453, foi bem antes. Com aquilo começou a verdadeira Reforma,
a construção verdadeira da Europa. Tudo que veio depois (Renascença,
Iluminismo, Século das Luzes) teve sua pedra fundamental naquela primeira
catedral.
É claro, as pessoas em
geral passaram ao largo dessa constatação, o que é uma pena, sob a ótica da
melhor interpretação que esperaríamos sobre a geo-história.
Vitória, domingo, 30 de
junho de 2002.
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