Saturday, November 02, 2013

Transparência Racional (da série Expresso 222..., Livro 2)


Transparência Racional


 

                        No livro de Leandro Konder, O Que é Dialética, São Paulo, Abril Cultural/Brasiliense, 1985, Coleção Primeiros Passos, p.6, ele coloca uma citação de Sartre, da Crítica da Razão Dialética, de que selecionei esta parte: “No curso da ação, o indivíduo descobre a dialética como transparência racional, enquanto ele a faz, e como necessidade absoluta enquanto ela lhe escapa, quer dizer, simplesmente, enquanto os outros a fazem”, grifo e negrito meus.

                        No modelo coloquei a lógica como dialética monal ou direta, e a dialética como lógica dual, ou de relações. Na língua cognata LÓGICA = DIALÉTICA, e não vou explicar porque, vá ler. São a mesma coisa.

                        Porém podemos pensar que uma seja do lado dos sentimentos, a lógica, instintiva, de campo, enquanto a outra esteja do lado da razão, a dialética, racional, de partículas.

                        Por ser de relações é por excelência científica e técnica. Contudo, é rejeitada por ambas, escarnecida e deplorada, por ter sido objeto de debates medievais, e desde a Grécia antiga.

                        De fato a dialética foi inventada pelos gregos antigos, enquanto na China o taoísmo produzia autonomamente sua versão. A dialética é o taoísmo ocidental e o taoísmo é a dialética oriental, esta voltada para os sentimentos, aquela para a razão. Enquanto o taoísmo prosperou por dois mil e quinhentos anos, a dialética teve idas e vindas, em círculos, sendo finalmente desaconselhada para menores.

                        Hegel (filósofo alemão, 1770-1831, 61 anos entre datas) renovou a dialética, no que foi seguido de Engels (filósofo alemão, 1820-1895, 75 anos entre datas). Este último consagrou os princípios do primeiro, as três leis da dialética, às quais Trotski somou uma e eu ajuntei dois corolários, de que já falei, e dos quais falarei, tendo tempo, num texto próprio.

                        Desde então a dialética não foi acrescida pelos filósofos, e foi rejeitada com vigor pelos cientistas, como fonte de bizantinismos, o que está longe de ser, pelo contrário. Deverá ser o instrumento final de libertação das trevas nas quais adormeceu a consciência.

                        Em que medida, como disse Sartre, a dialética leva à TRANSPARÊNCIA RACIONAL? E o que viria a ser ela?

                        No dicionário agregado ao Windows e no Michaelis posto na máquina transparência é claridade, cristalinidade, limpidez, que por sua vez significam brilho, fulgor, lucidez, luz, nitidez, resplendor, magnificência, cintilância, resplandecência. Poderíamos investigar muito tempo.

                        Segue-se que é:

·         brilho racional,

·         fulgor racional,

·         lucidez racional,

·         luz racional,

·         nitidez racional,

·         resplendor racional,

·         magnificência racional,

·         cintilância racional,

·         resplandecência racional,

·         claridade racional.

·         cristalinidade racional,

·         limpidez racional, e outras conformações.

A razão deve ficar limpa, portanto, de toda nódoa, de toda dificuldade de pensar, de relacionar os elementos dois a dois, criando conceitos cada vez mais elevados, à maneira kantiana, do simples para o complexo, com segurança crescente, no final com total segurança.

A razão deve ser transparente.

Sem obstáculo, sem dificuldade, sem travamento, rompendo com facilidade os estorvos do caminho. Resolvendo os problemas, obtendo em prazo mínimo as soluções mais efetivas, de máximo rendimento.

A dialética tecnocientífica não deve matar suas congêneres predecessoras, a saber, as dialéticas magicartística, teo-religiosa e filo-ideológica, pelo contrário, deve resgatá-las de sua baixa qualidade na produção de conceitos e de sua baixa produção quantitativa. Deve dar-lhes sustentação e nova delineação de objetivos, tornando-as seguras para seus propósitos específicos. Arrancando-as de sua timidez e debilidade instrumental.

Isso significaria a transparência da razão.

Ora, essa cristalina qualidade depende de colocar dois conceitos em adequada relação ou afinidade, o que está sujeito, por outro lado, à felicidade na definição dialética dos conceitos, na correção das ligações.

O que vemos hoje é que cada um define as coisas a seu modo.

Embora haja um conhecimento internacional, digamos tecnocientífico, não há reuniões para definir corretamente as palavras e os conceitos, como aplicáveis a cada nível do Conhecimento geral. Alguém proclama a definição e ela é aceita ou não com base na autoridade, a mesma que é rejeitada desde Galileu e Descartes.

Não há questionamento das palavras, conceitos e definições. Não há rejeição aberta, só queda em desuso. Se isto e aquilo devem desta ou daquela forma ser aceito pela maioria, por quê palavras, conceitos e definições são aceitas sem maiores preocupações?

A transparência racional pressupõe a transparência das palavras, dos conceitos e das definições.  SE estas não são as mais perfeitas de cada época, como esperar obter os melhores resultados dos pensamentos que relacionam os objetos? SE os instrumentos não são bons, como o será seu uso?

Se os cientistas não estão usando a dialética, é como disse Sartre, ela não é para eles fator de transparência, é só necessidade absoluta, inadiável, o que nos fala do orgulho, de todo tipo de orgulho, mas especificamente o tecnocientífico, como pernóstico, petulante, insolente, atrevido, inculto, desafinado do melhor sentido e direção. É uma flecha torta, num arco mal construído, sem alvo definido.

Com algo assim, não admira que a Tecnociência produza pouco, para tanta necessidade de todos os seres humanos. No máximo ela resolve alguns problemas medíocres postos pelas elites segregadoras, e se acha o fino da bossa por isso.

Vitória, segunda-feira, 20 de maio de 2002.

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