Saturday, November 02, 2013

Nossos Netos (da série Expresso 222..., Livro 3)


Nossos Netos

 

                        Está no livro de Hubert Reeves, Um Pouco Mais de Azul (A Evolução Cósmica), São Paulo, Martins Fontes, 1986.

                        Logo a Martins Fontes!, que a gente respeita tanto.

                        No capítulo 7, O Futuro da Terra, p. 117 e ss., em especial na página 119, sob o título Reanimar o Sol Enfraquecido, o autor se preocupa com o que acontecerá com nossa estrela daqui a cinco bilhões de anos, quando, segundo os cientistas, o Sol terá queimado seu combustível e “morrerá”, quer dizer, se expandirá primeiro, ejetará suas camadas exteriores, contrair-se-á até tornar-se uma anã branca e depois uma anã negra, e diz: “Às vezes me surpreendo preocupado com nossos netos futuros, que viverão este período crítico da morte do Sol”, negrito meu.

                        Nós nos perguntamos se lemos certo.

                        É isso mesmo, cinco bilhões de anos?

                        Depois de ler repetidamente fica a certeza de que ele disso mesmo 5.000.000.000 anos. Não 5, 50, 500, 5.000, 50.000 (tempo da espécie humana na Terra), nem 500.000, nem 5.000.000 (mais do que o tempo dos hominídeos), nem 50.000.000, nem 500.000.000 de anos (que recua para perto da chamada “explosão Cambriana” da irradiação da vida superior), mas cinco bilhões, mais que os 3,8 bilhões de anos da primeira vida, mais que os 4,5 bilhões de anos da existência da Terra, mais que os 5,0 bilhões de anos de criação do Sol.

                        E ele não se preocupa, apenas, ele propõe soluções:

                        1) “(...) uma migração para outros planetas mais distantes do Sol. Dois satélites de Júpiter, Ganimedes e Calisto possuem importantes reservas de água (...)“. Veja que seria uma migração em massa, agora seis bilhões de pessoas. Se não conseguimos enviar sequer uma, como faríamos com seis bilhões? O futuro certamente proporcionará todas as soluções.

                        2) “A segunda solução consiste em deslocar a Terra inteira e mantê-la a uma distância sadia de nosso Sol ameaçador”. A Terra tem massa de 5,98.1024 kg, ou 5.980.000.000.000.000.000.000.000 kg. Parece pouco, para ele.

                        3) “Felizmente, existe uma terceira solução, muito mais difícil, mas também de muito maior duração. É a reanimação do Sol, no mesmo sentido em que se reanimam os corações enfraquecidos (esquema 7)”, e sugere então ou a colocação de bombas nucleares ou o envio de um feixe de laser. Porém, modestamente, refere que não sabe como o Sol não vaporizaria os artefatos. Nos consola dizendo que o Sol, com essa providência, poderia viver mais dez a 100 bilhões de anos, se os cinco que se passarão até ele explodir não bastarem à humanidade vindoura.

                        É impressionante demais.

                        Estamos pensando como passar ao próximo ano, ou chegar a 2040, ou um pouco além, e eles fala em cinco, dez, 100 bilhões de anos.

                        As culturas têm pequeno rendimento, assim como tudo na Natureza. É preciso pagar um preço entrópico pela sobrevivência, a ineficiência, a par da eficiência de conversão. Alguma fração da humanidade mergulha no imponderável, no suspeito, na esquisitice.

                        Contudo, depõe a favor da civilização o fato de que certas coisas são toleradas e todo tipo de manifestação poder acontecer, sem maiores transtornos. Pode-se falar quase tudo, gastar tempo, espaço, recursos, riqueza, sem causar tremor mais demorado em ninguém.

                        Esse é o valor maior da coletividade cristã, a tolerância.

                        As pessoas mais doidas do mundo encontram abrigo e podem falar as asneiras que quiserem, podem consumir nosso tempo com doideiras sem serem repudiadas a fundo. As coisas simplesmente são deixadas a morrer nalgum canto, como nesse livro.

                        Uma importante editora deu chance de publicação a essa pessoa, para que ela tivesse oportunidade de falar sandices. Não 50 mil anos, que é o tempo atual de existência da humanidade, mas 100 mil vezes isso. Se você contar uma existência inteira da humanidade a cada segundo, 3.600 por hora, levará cerca de 28 horas, mais de um dia inteiro, para chegar a esse tempo. A história toda chega a no máximo 3,5 mil antes de Cristo, de modo que ainda vamos a caminho de atingir os primeiros seis mil anos de escrita!

                        É um espanto, mas é um anúncio maravilhoso, assombroso, das alturas a que o cristianismo permitiu a humanidade chegar, especialmente o Ocidente, em termos de aceitação alheia.

                        Vitória, segunda-feira, 27 de maio de 2002.

No comments: