Thursday, June 27, 2013

Pigmeu (da série Conto Tudo Novo)


Pigmeuleão era grande artista.


Grande no sentido da perfeição de suas obras, porque pequeno no tamanho. Era escultor, mas dos mais competentes do mundo, TÃO competente que era comparado aos maiores: Policleto e Fídias, Michelangelo, Bernini, Rodin, Kuebler, Mueck e os hiper-realistas pós-contemporâneos.

A questão toda é que ele era baixinho, entende?
Baixinho MESMO, entende?

Para dizer tudo, 1,42 m, o pessoal fazia ele de roll-on (esse é de um amiga, aconteceu com ele também e bem antes, só que eu nunca tinha pensado nisso) nos ônibus. Apoiavam o sovaco na cabeça dele e ficavam esfregando, parecia desodorante roll-on. Isso quando ele era estudante, depois que enricou nunca mais andou de ônibus.

E teve aquela vez em que indo de Jucutuquara para Camburi jogar futebol pisaram no calcanhar dele e pediram desculpas, um cara grande, ele virou pra mim e disse entredentes: “depois que inventaram essa tal de desculpa nunca mais pude dar porrada num filho da puta!” Nunca esqueci, ele tinha 18 pra 20, faz quase 40 anos.

NUNCA, MAS NUNCA MESMO o chame de Batata, nem os amigos mais íntimos, ele fica uma arara: uma arara pequena, é certo, mas uma arara. Mais de uma amizade esteve para acabar antes que o idiota se desse conta.

E alguns maldosos dizem Pigmeu-Leão. Leão ele é mesmo, um leão pequeno, é claro, um gatinho, mas um gatinho feroz, não fique na frente dele. Por quê as pessoas falam isso? Inveja, eu acho, pela grandeza moral e artística dele, pelo dom, eu creio. Ele sofre, mas sofre em silêncio, não quer dar o braço a torcer, o bracinho a torcer, é certo, mas é resistente, tem estatura moral que falta a tantos.

Agora, chamar de Pigmeu já é maldade. Pior ainda é Pig, porco em inglês, isso nunca, aí já é achincalhe, já dei porrada em três.

De nome mesmo é Tércio, por ser o terceiro filho.
Acontece que o Tércio, com aquele complexo de inferioridade que tem e que não deveria ter, em vista de sua grandeza artística, queria mulher, como todo macho quer mesmo, mas um mulherão, e pôs-se a esculpir, camarada, aquela foi demorada, porque a par de suas tarefas e das numerosíssimas encomendas todas caras ele queria detalhes, daí demorou meses, demorou anos. Encomendava um bloco, começava, quando já estava na metade ficava com raiva, quebrava tudo. Começava outro e depois de dois anos e meio de trabalho um detalhezinho não encaixava e ele rebentava tudo com marretas, claro, marretinhas que eram como martelos para os outros, mas para ele era marreta e pronto.

Então, lá pela sétima ou oitava tentativa, ficou pronta e fosse pelo que fosse Pigmeuleão ficou apaixonado. Xonadinho! Doido de pedra.

Ele colocou o nome de Gala Téia.
Pois é, a Téia despertou para a vida e de início via somente o Tércio, não via mais ninguém, ficaram de amores; com o tempo e as visitas a Téia conheceu um moço de barriga de tanquinho, saradão, cheio de músculos, alto, pouco mais de 1,80 m, ela que tinha 1,73 m, se apaixonaram e fugiram juntos, Tércio ficou a ver navios que ele mesmo fazia. Por quê não construiu a formosíssima de 1,35 m, pouco menos que ele? Eu falei, mas conselho adianta?

Desde então ele nunca mais fez nem um pirulito de pedra, parou de esculpir, está vivendo de rendas em Nice e a chama de Galinha.

Eu disse:
Tércio, não faz isso.
Ele quis me ouvir?

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