- Cara, tô com uns pensamentos esquisitos
demais.
- Esquisitos? Esquisitos, como?
- Esquisitos, esquisitos. Nem parece
coisa minha.
- Já foi ao psicólogo, ao
psiquiatra?
- Você acha que eu tô doido?
- De modo nenhum, mas agora eles têm
umas máquinas porretas, na realidade são programáquinas, programas-máquinas. Eu
mesmo já fui.
- E curou?
- Não curou, mas transformou em
impulso suicida. Já convenci três a se suicidarem.
- Rapaz, que coisa maluca.
- É mesmo.
- Pois, então, tão vindo uns
pensamentos malucões na minha cabeça.
- Ruim, assim?
- Ruim mesmo. Eles ficam invadindo
minha consciência, coisas que nunca pensei em fazer.
- Acho que você tá desregulado.
- Será?
- Só pode. O primo da meia-irmã da
minha tia do Pará tava assim. A antena dele desregulou, ele tava zuretinha.
Zureta, zureta, zureta. Comportava-se e falava como um buriato, lá da Rússia,
queria morar numa yurta, montar a cavalo, ter três mulheres igual os antigos de
lá, uma doideira. Pro cara regular foi duro. Teve de ir pra São Paulo.
- Sério assim?
- Foi. A antena dele entrou em
curto. Sabe o Nicolelis, aquele brasileiro que em 2028 lançou a neuroprojeção?
Ele voltou a São Paulo e colocou a clínica dele lá, o Fábio, esse rapaz, foi se
tratar lá. Invasão, meu filho, os neuro-hackers incluem pensamentos na sua
cabeça, coisa que você jamais pensou ou imaginou, coisas contrárias ao seu modo
de ser. Esse menino era contador, você imagina só ele andando de cavalo pela
cidade. Piração pura, sem falar em querer casar com várias ao mesmo tempo,
ficava incomodando as moças do escritório. E a tenda que ele armou no quintal
da casa? A mulher quase foi embora, armou barraco. Os neuro-hackers são
crianças que ficam inventando personalidades pras pessoas, é constrangedor. De
quantos bits é a sua chave?
- 128.
- Bom, nem deveria haver problema de
violação, pode ser mais desregulação da chave, entra um ou outro pensamento
esparso. Falar com o Nico é praticamente impossível, mas você pode
teleconsertar com um dos atendentes.
- Custa caro?
- Que nada, tá nos planos.
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