Tem gente que tem vocação, enquanto outros
não têm.
É dom.
Os americanos dizem gift, presente, dádiva.
Nem que seja para o mal, têm.
Teve a mulher que saiu do outro lado da rua
de bicicleta, eu sentado na esquina com o labrador, encostou-se à gente e
começou a gritar: “segura esse cachorro, segura esse cachorro que ele vai me
morder”.
Teve o velho que veio de longe, por trás, o
cachorro pulou porque queria brincar e ele: “se esse cachorro tivesse me
mordido eu iria te processar”.
Teve o sujeitinho na padaria.
SUJEITINHO (chegando a mim, vindo do nada)
– foi você mesmo.
EU – eu o quê?
SUJEITINHO – foi você que brigou comigo e
minha mulher no ônibus.
EU – nem te conheço. Primeiro que não sou
disso, segundo que seria errado proceder assim.
SUJEITINHO – você deu uma carteirada na
gente.
EU – eu, não.
SUJEITINHO – foi, sim, no ônibus.
EU – fui de seletivo de manhã bem cedo.
SUJEITINHO – foi nesse mesmo, que passou
por Manguinhos.
EU – não, o meu passou por Laranjeiras.
SUJEITINHO – foi você sim (e foi embora
furioso).
É dom.
Dom do Capeta.
A gente pensa que é só Deus que dá dons,
mas pode ser que o Cão também faça isso. Gente implicante, que vive para
implicar, gente que fura fila sem a menor consideração, gente que provoca
guerras e conflitos, que rouba, que furta, que bate em mulher e criança, que
trai, todo tipo de gente. Já nasce assim com essa praga ou adquire durante a
vida? É uma espécie de vírus? Será que aprimoram a capacidade de provocar?
É vocação?
Teve um que passou por mim na praia e disse
que meus amigos estavam esperando na mesa (estava chuvoso, com garoa na
beira-mar) e lá estavam os caramujos. Tem os que tocam a campainha da casa, só
para te deslocar de onde você estiver (já estão desenvolvendo a maldade desde
pequenos).
Não sei se alguém já se interessou em
coletar casos, iam chover através da Internet.
Nada tira da minha cabeça que é vocação.
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