Monday, June 10, 2013

Xuxitler (da série Tudo Conto)


Numa dessas experiências de cruzamento genético os cientistas alemães decidiram tentar abrandar o espírito perverso de Hitler cruzando-o com Xuxa, a rainha dos baixinhos, a frente sendo Xuxa e as costas Hitler: Xuxa-Hitler, como o deus-biface Janus.

Nos primeiros tempos deu certo, pela frente era uma beleza, mas pelas costas havia Hitler e ele era mesmo uma praga. Pela frente era só “meus baixinhos, meus queridinhos”, mas pelas costas parece que a Xuxitler batia nas crianças. Um acinte, uma vergonha indizível.
Isso provocou muita polêmica através do mundo.
A principal pergunta era: por quê juntar coisas antagônicas?
Os tecnocientistas têm direito de fazer tais experiências, colocando em risco a totalidade ou frações da totalidade? A humanidade deve se sujeitar a isso? E, mais ainda, devemos tolerar essas ameaças às crianças? Temos de, em qualquer lugar, aceitar as intimidações aos infantes?
Abriram duas correntes.
Uma era a favor da liberdade irrestrita da “mão invisível” científica, com a justificativa de serem os cientistas capazes, em razão de seu pensamento afiado e lógico, de discernir perfeitamente o certo e o errado, linha contestada pelos que dizem “não”, a partir dos próprios exemplos geo-históricos: os tecnocientistas não assumem seus erros, só seus acertos.
Pois essa outra, a contrária dizia haver necessidade de colocar balizamentos, parâmetros intransponíveis, relativos à moral: por exemplo, crianças não têm todos os elementos de julgamento, nem apuraram suas capacidades de pensamento a ponto de se precaverem quanto às armadilhas e não devem ser expostas às anomalias das personalidades desviantes.
Ao que respondiam os outros: como elas vão crescer no mundo perverso? Que defesas acumularão contra a perversidade se não a conhecerem desde cedo?
Os da linha “do bem” contrargumentavam não se tratar só de futuro, tipo “as crianças são nosso futuro” (não é só uma frase), mas da formação de gente que iria dirigi-lo, pois nós, atuais dirigentes, viemos de toda permissividade. Por acaso devemos deixar os assassinos confessos concorrer à presidência?
Certo, diziam os contrários, contudo um pepino torcido em pequeno ainda é um pepino torcido, há mácula nele, a liberdade não foi respeitada, aquela desejada ignorância completa de regras.
Ah, é? No entanto, apontavam os “do bem”, não somos isentos de regras, nenhum ser humano. Vivemos segundo regras, leis: a nossa maioridade individual - já adulta – não é capaz de lidar com os erros vistos como tais pelo coletivo, quanto mais as crianças! As crianças, sob esse argumento falacioso “do mal” deveriam então ser expostas a venenos, a choques elétricos, ao fogo, a trombadas de veículos para aprenderem a futuramente não se exporem? Sem saber discernir perfeitamente devem ser as crianças expostas à sexualidade malsã, aos desvios psicológicos humanos e a tanta coisa mais que pode distorcer seu julgamento?
Veja só o que uma simples experiência genética pode provocar.
Tudo porque a Xuxitler, pelas costas, dava beliscões e puxava as orelhas das crianças, sem falar em outras coisas, dizem. Era só o lado malvado, afinal de contas.

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