Sunday, October 27, 2013

O Mundo Assombrado pelos Cientistas (da série Expresso 222..., Livro 1)


O Mundo Assombrado pelos Cientistas

 

                        No livro de Carl Sagan, O Mundo Assombrado pelos Demônios (A Ciência Vista como uma Vela no Escuro), São Paulo, Cia. Das Letras, 1996, o capítulo 7 tem esse título, p. 121 e ss., e ele opõe a Ciência, tomada como Conhecimento (como se não houvesse outros), a todas as outras formas dele, que levariam ao obscurecimento da razão.

                        É claro, a Ciência, que Sagan amava, é a heroína.

                        Também amo a Ciência, o conjunto de ciências, mas não perco de vista o seu lado negativo.

                        Para começar, dizem que 50 % dos cientistas trabalham para a chamada “indústria da morte”, o complexo industrial-militar, que trabalha constantemente para aprimorar e tornar mais variados e eficazes os modos de matar seres humanos e desfigurar as paisagens. Coloquei “dizem”, porque é tudo secreto, mas quem estuda esse lado fala em tal percentual.

                        Depois, os cientistas realmente fizeram coisas notáveis, memoráveis, fantásticas, francamente libertárias, e aplaudo até o furor esse lado.

                        Contudo, sendo as coisas de soma zero, decorre de cada conquista uma série extraordinária de problemas, que às vezes agudizam em lugar de melhorar a situação geral da humanidade. Pode-se dizer que não é culpa deles, mas a verdade é que lhes falta visão de conjunto, de totalidade da matriz vital e racional da Terra, e, portanto, eles propõem soluções de momento, que servem naquele pontinstante ali, sem maiores considerações sobre a letalidade subseqüente das soluções em outros pontos.

                        Tal como com os técnicos, de que são os mentores, especialmente os engenheiros, a solução é local, aplicada naquele tempo preciso.

                        Isso vem, com veemente certeza, da unilateralidade da análise, sem investigação dita holística, do todo, e das implicações gerais da introdução de um vetor-solução sobre as demais partes da matriz. Só muito tardiamente foram perceber, na ecologia, que os antigos agricultores, em suas práticas milenares, não eram exatamente bobos, pelo contrário. Agora recomendam os agrônomos e biólogos como novidade, que eles teriam descoberto, o que aqueles agricultores e pecuaristas faziam, justamente àquilo que eles negavam sustentação científica e técnica.

                        Pois bem, se o mundo está sendo assombrado pelos demônios, igualmente está sendo assombrado pelos cientistas e técnicos. Nos dois sentidos: 1) o positivo, das coisas espantosas que têm feito, e 2) dos espíritos perversos da Ciência ditatorial, que impõem as soluções, como se todos os seres humanos fossem tolos que devessem render graças pela benignidade dos pesquisadores.

                        Resultou de tal orgulho desmedido que o mundo vem sofrendo conseqüências devastadoras em virtude dessa prepotência e unilateralidade, dessa superioridade aborrecidíssima, cujo custo total em consertos e reparações não sabemos avaliar, mas que seguramente será rateada pela coletividade mundial, Brasil e Espírito Santo no meio.

                        Ficamos com essa constatação: de que os demônios por vezes apresentam-se com o que parecem ser ótimas soluções científicas. E com a certeza inequívoca de que devemos tomar mais cuidado no futuro, e avaliar melhor as propostas de aplicação de recursos públicos e privados nas ciências.
                        Vitória, sexta-feira, 19 de abril de 2002.

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