Thursday, October 31, 2013

Os Níveis do Xadrez (da série Expresso 222..., Livro 2)


Os Níveis do Xadrez

 

                        O tabuleiro do xadrez tem 64 casas, 8 x 8.

                        São em geral chamadas de BRANCAS e PRETAS, mas podem ser de quaisquer cores, aos pares, até cor-de-rosa e brancas, digamos, para os veados. Ou verdes e azuis, o que for, verde representando a vida e azul os ataques a ela, para os ecologistas.

                        As peças são de cores contrárias, peças pretas em casas brancas e peças brancas em casas pretas, como no Yin e Yang – os times jogam dialeticamente nas posições contrárias.

                        Há oito peões na fileira da frente; e na fileira de trás duas torres nas extremidades, dois cavalos mais para dentro simetricamente, dois bispos, o Rei e a Rainha. O Rei das Pretas fica em casa branca, mas do outro lado, em oposição, o Rei das Brancas, ficando em casa preta, se situa defronte do seu opositor, e vice-versa, de modo que as rainhas também se opõem.

                        Evidentemente os peões representam o trabalho braçal, e são empurrados à frente sem a mínima consideração (seja dos patrícios escravistas, dos reis feudalistas, da burguesia capitalista ou dos intelectuais socialista). Os cavalos simulam as forças armadas de defesa e ataque. Os bispos – veja que são bispos, não sacerdotes – significam o conhecimento, mediado pelas lideranças, e não, como primitivamente, a Igreja. Mais recuadamente seriam os magos. Não são somente os magos/artistas, nem os teólogos/religiosos, nem os filósofos/ideólogos, nem os cientistas/técnicos e os matemáticos, mas todos, em conjunto, ou seja, a pesquisa & desenvolvimento, a busca de entendimento.

                        A Rainha representa o sexo feminino e o Rei o sexo masculino, porém, além disso, ambos representam a estabilidade do Estado.

                        As torres expressam o poder econômico/sociológico, a produção/organização.

                        Com isso está montado o cenário para os conflitos todos, das guerras às disputas por informação/controle-comunicação, ou info-controle ou IC. O objetivo todo é “tomar o Rei”, quer dizer, incorporar o Estado estrangeiro à sua órbita de influência.

                        Existem dois tipos de perigo: o xeque, em que o Rei-Estado é ameaçado, mas há chance de escapar, e o xeque-mate, em que não há nenhuma oportunidade de evasão – segue-se que o Rei-Estado se rende, é tombado simbolicamente.

                        Como curiosidade, diz-se que quando o inventor apresentou o jogo ao Rajá (rei hindu, da Índia) há muitos e muitos séculos, ele ficou tão satisfeito que prometeu uma recompensa. O inventor, modestamente, pediu que fosse colocada na primeira casa um grão de arroz, na segunda dois, na terceira quatro e assim por diante, de modo que o rei, mais feliz ainda, mandou prontamente que ele fosse satisfeito. Isso é uma progressão geométrica, na 64ª casa sendo necessários 9.223.372.036.854.775.808 grãos, ou seja, 9,2 quintilhões (se um grão pesar um grama, isso equivaleria a 9,2 milhões de toneladas), e a soma é o dobro disso menos um, quer dizer, 18,4 quintilhões. O inventor, apesar de matemático muito esperto, foi logo em seguida morto pelo carrasco do Rajá, segundo contam.

                        Evidentemente o xadrez tem encantado as gerações continuamente. Existem grandes mestres, mestres, aficionados, meros jogadores sofríveis e espectadores. É tão difícil que a URSS em sua emulação ou imitação do Ocidente, querendo estar acima e à frente, investia horrores na descoberta dos talentos e em seu financiamento, de forma que, enquanto existiu o pseudocomunismo a maioria dos grandes mestres veio de lá. O primeiro grande mestre americano a vencer os soviéticos foi Bobby Fisher, na década dos 1970, e o primeiro brasileiro a se tornar grande mestre foi Mequinho, que depois entrou em colapso e se retirou da mídia.

                        Só recentemente, creio que em 2001, um programa de computador foi capaz de derrotar um grande mestre.

                        E, veja só, o xadrez tem todas essas dimensões.

                        De divertimento, de co-elaborador do pensamento, de visão larga dos conflitos, de árvore das decisões. E tem um outro sentido, mais alto, de ser a briga ou disputa de dois infinitos, 8 x 8, Natureza e Deus, as duas faces de ELI, dois mundos ou modelos em choque.

                        O xadrez deveria ser jogado por todos. Eu mesmo sou um apaixonado que nunca o jogo, pois haveria risco de empenho demais, e de eu me esquecer das tarefas. Em todo caso ele deveria ser ensinado em todas as escolas, mormente nas mais elevadas, como graduação, mestrado, doutorado e pós-doutorado, bem assim nas empresas, em particular as grandes, onde decisões sobre investimentos devem ser tomadas, necessitando das precauções que esse jogo espetacular poder proporcionar, vertendo-se o Estado ou governo para Administração empresarial, e redesenhando as figuras: peões como força de trabalho, bispos como conhecimento econômico (agropecuário/extrativista, industrial, comercial, de serviços e bancário), etc.

                        E pensando em cada elemento por sua psicologia (figuras, objetivos, economia/produção, sociologia/organização, e espaçotempo ou geo-história).

                        Ora, essas alterações tornam o jogo ainda mais interessante.

                        Vitória, segunda-feira, 13 de maio de 2002.

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